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[...]

Era um lugar bonito. Parecia uma prainha, um laguinho... eu não sabia bem dimensionar, mas tinha areia e um mar calmíssimo na minha frente. E muitas árvores ao redor. O sol era bem fraquinho e eu estava na sombra... uma sensação muito agradável em uma paisagem mais agradável ainda.

— Mãe. — Eu ouvi uma criança dizer. Não me virei, até porque não achei que era comigo. — Mãeeee! — Chamou com mais vigor e eu vi uma garotinha cheia de frufrus rosinhas correndo na minha direção. Ela era tão fofinha e pequena, senti meu coração ficar pequeno de amor. Me abaixei na frente dela, já que a menina parecia estar muito interessada em mim.

— O que foi? — Perguntei.

— Mamãe, vamo entrar na água, vamos. — Ela pegou na minha mão e apontou. Pisquei ao entender que ela estava falando comigo. Que porras?

— O quê? — Não entendi muito bem, mas levantei, deixando a menina em um maiô rosa me puxar pela mão, enquanto ia tropeçando nos próprios pés. Era muito, muito fofo. Me deixei levar pelo encantamento da figura que estava na minha frente, tão pequena...

Ela colocou os pezinhos na água primeiro e pulou, dando um gritinho de felicidade e voltando pro meu lado na hora, abraçando minha perna. Achei que eu fosse derreter de amor.

— Tá gelada? — Brinquei, colocando uma mão sobre os cabelos fininhos e macios dela. Escuros...

— Tá. — Ela me apertou ainda mais. — Entra comigo, mãe.

— Mãe? — Eu não entendi, mas dessa vez, acompanhei a garotinha até a água, onde o frio da água se espalhou pelo meu corpo como um arrepio gelado, arrepiando todos os pelos do meu corpo e me despertando.

Me ergui nos cotovelos, suspirando pesadamente. No segundo seguinte, eu tava no meu quarto numa penumbra só. A única luz acesa era do abajur e o Barbás já estava de pé e vestido.

— Te acordei? — Perguntou, fechando a porta do guarda-roupas.

— Eu tive um sonho esquisito... — Disse dando de ombros. — Deve ser o frio. — E puxei mais as cobertas sobre mim. Na minha mente, a imagem da garotinha de cabelos e olhos escuros não me deixou em paz. — Nem amanheceu direito, pra onde você tá indo tão cedo?

— Eu tenho que ver como ficou o lance da carga que vai chegar pra esse mês ai, o contato chega daqui há 15 minutos. — Ele olhou no relógio do pulso dele. — Tenho que ralar, mas venho almoçar contigo. Volta a dormir que tá cedo ainda.

Will veio até mim e me deu um beijo na minha testa, saindo em seguida. Caí de volta nos travesseiros, pensando que caralho de sonho tinha sido aquele. Minha mente tinha ficado abalada com a coisa da grávida e do hospital mesmo... só assim pra eu sonhar com criança. Com uma menina que parecia comigo... e com ele. Deixei o sono me encontrar de novo, me sentindo estranhamente contagiada pela voz da menininha.

[...]

Os dias passavam rápidos, em um piscar de olhos. Eu e o Barbás estávamos caindo na rotina outra vez e assim, umas semanas foram passando com a gente naquele ritmozinho devagar. Quer dizer... eu tava num ritmo desacelerado, o Barbás, por outro lado, parecia cada vez mais frenético. Eles três tavam correndo atrás de estabilizar a favela de uma vez, o que, na minha visão, já tinha acontecido. O tempo tinho sido um santo remédio pra todas as rivalidades que podia aparecer entre as bocas e os amigo. Por outro lado, tinha uma possível desavença que tava começando a me preocupar...

Eu e o Barbás estávamos comendo num restaurante dali da principal. Eu tinha acabado de voltar do Vidigal, onde eu tinha ido visitar minha mãe e meus irmãos. O Russo tinha cedido a casa pra eles ficarem por um tempo, enquanto a Dalila voltou do hospital direto pra casa. Nas primeiras semanas que tive que ficar lá ajudando ela, que ainda sentia dor no quadril quando andava muito. Depois, quando ela se recuperou, eu só ia ficar lá de vadiagem com ela mesmo. Curtindo a solidão pelo Wallace e o Will estarem sempre na correria agora.

Enquanto almoçávamos de boa, o celular dele não parava de tocar. Ele ignorou as primeiras vezes, depois se irritou e atendeu puto.

— Oh porra, irmão. Já falei que não vou nessa porra, porque esse fodido ai tá me deixando puto. Manda o Parma ir resolver essa pica ai. — Falou bolado no telefone. — Como não tem, irmão? Ah para, porra.

Comi em silêncio, terminando meu prato de lasanha e olhando pra ele de canto.

— Tá, tá, tá, foda-se. Daqui a pouco eu vou ai, manda descer lá pra Barcelos. — Disse, puto da cara, desligando e jogando o celular na mesa. Ele finalizou a cerveja dele muito rápido. — Esses caras do teu pai são uns pau no cu do caralho. Porra, que ódio que eu tô desses filhos da puta.

— Ué, que houve?

— Sei lá, porra. Esse braço dele tá aqui toda semana só pra foder com a minha paciência. — Ele reclamou, pedindo pra dona fechar a conta e trazer um maço de cigarro pra ele. Ultimamente ele tava fumado pra cacete. — O combinado com teu pai não era mensal? Toda semana aqui na minha porta é foda. Tem arrego pra pagar também, porra. Dinheiro não dá em árvore nessa porra não.

— Que merda. — Sussurrei, fazendo uma careta. Não queria nem me meter muito nisso não, eu já tinha interferido o suficiente naquela história. Não era mais problema meu.

Amor na GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora